Mais uma vez estou no famoso expresso da agonia, ainda que hoje possa dizer que o clima do coletivo está bastante tranquilo. É claro que assim que adentrei o cobiçado busão, dei de cara com um senhor quem fez de minha vida um inferno a um ano atrás e que provocou, em partes, a prorrogação desta saga indesejada. Mas nada como um olhar de "Nem te conheço" para minimizar o encontro compulsório. De qualquer forma, encontrava-me desarmada e leve, em minha poltrona, quando me vem uma talzinha com ares de demanda e vocação pra vampiro, "pedir para fechar um pouquinho" minha cortina, com a mão na mesma, forçando-a no meu braço, que estava apoiado no parapeito. E eu, claro, em toda minha tontice, cedi ao pedido da sinhazinha petulante, fechando 75% da minha visão da estrada e céu limpo, de um azul estonteante.

E esboços de sorrisos podem ser vistos em vários dos rostos desconhecidos pelo coletivo.
Ah, a frescura na face de não cumprir um dever!
Faltar é positivamente estar no campo!
Que refúgio o não se poder ter confiança em nós!
Respiro melhor agora que passaram as horas dos encontros.
Faltei a todos, com uma deliberação do desleixo,
Fiquei esperando a vontade de ir para lá, que eu saberia que não vinha.
Sou livre, contra a sociedade organizada e vestida.
Estou nu, e mergulho na água da minha imaginação.
É tarde para eu estar em qualquer dos dois pontos onde estaria à mesma hora,
Deliberadamente à mesma hora...
Está bem, ficarei aqui sonhando versos e sorrindo em itálico.
É tão engraçada esta parte assistente da vida!
Até não consigo acender o cigarro seguinte... Se é um gesto,
Fique com os outros, que me esperam, no desencontro que é a vida.
Encostei-me para trás na cadeira de convés e fechei os olhos,
E o meu destino apareceu-me na alma como um precipício.
A minha vida passada misturou-se com a futura,
E houve no meio um ruído do salão de fumo,
Onde, aos meus ouvidos, acabara a partida de xadrez.
Ah, balouçado
Na sensação das ondas,
Ah, embalado
Na idéia tão confortável de hoje ainda não ser amanhã,
De pelo menos neste momento não ter responsabilidades nenhumas,
De não ter personalidade propriamente, mas sentir-me ali,
Em cima da cadeira como um livro que a sueca ali deixasse.
Ah, afundado
Num torpor da imaginação, sem dúvida um pouco sono,
Irrequieto tão sossegadamente,
Tão análogo de repente à criança que fui outrora
Quando brincava na quinta e não sabia álgebra,
Nem as outras álgebras com x e y's de sentimento.
Ah, todo eu anseio
Por esse momento sem importância nenhuma
Na minha vida,
Ah, todo eu anseio por esse momento, como por outros análogos ---
Aqueles momentos em que não tive importância nenhuma,
Aqueles em que compreendi todo o vácuo da existência sem inteligência para o compreender
E havia luar e mar e a solidão, ó Fulana.
Preciso dizer de quem é??